Gil Scott-Heron

(publicado em Março na Time Out)


Gil Scott-Heron
I’m New Here
XL/Popstock
***

Richard Russell, patrão da editora britânica XL, arrancou do silêncio o poeta da América urbana dos anos 70 Gil Scott-Heron. Pegou-se em parafernália electrónica e num reduzido leque de músicos (Damon Albarn e Chris Cunningham são os mais conhecidos) e fez-se o primeiro disco de originais em 16 anos do autor do enjoativamente citado “The Revolution Will Not Be Televised”.

A voz de Scott-Heron aos 60 anos tem marcas profundas do passar do tempo: enrola-se, perde-se entre a língua e os dentes, mastiga e compromete a clareza de outros tempos. O resultado é umas vezes tocante (cola-se bem a “Running”, os versos rodeados, à boa maneira da música concreta, por uma base rítmica que se assemelha ao bater de uma bola de basquetebol), outras irremediavelmente decadente, num registo entaramelado a lembrar Mark E. Smith dos Fall (como em “I’m New Here”, cantiga para guitarra acústica escrita por Bill Callahan).

Também por isto, a sageza de Richard Russell na construção instrumental de I’m New Here é preciosa. “Me and the Devil”, versão urbana-distópica do tema de Robert Johnson, é o melhor instante do disco, chegando-se ao trip-hop com uma eloquência que não se ouve no recente Heligoland dos Massive Attack. Contorne-se a profusão de interlúdios deste CD, cuja relevância não se detecta, e preste-se também atenção aos blues desenvoltos e de instrumentação hiper-minimal de “New York Is Killing Me”; à presença em espírito de Burial nos cerebrais edifícios dubstep em “Your Soul and Mine”; e à óptima melancolia orquestral mais clássica das duas partes do autobiográfico “On Coming from a Broken Home” e de “I’ll Take Care of You”. Juntos perfazem um disco a espaços entusiasmante, mas com ar de obra pouco consistente.

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