No fim de 94
enviei para Lisboa a candidatura a um lugar na delegação do Blitz no Porto.
Presumia-a desocupada: fora aos escritórios na Rua Júlio Dinis há semanas e
disseram-me que o Hugo Moutinho e a Raquel Pinheiro se haviam mudado para a
capital e só ali iam de vez em quando.
A carta seguiu
para Lisboa via Faro, onde os meus pais vivam e vivem e de onde procurava
trabalho e aguardava data de defesa da tese de licenciatura. Continha talvez um
currículo, uma apresentação meio provocadora que terminava com uma lista de afinidades
estética (Abba e Take That seguramente, mais uns nomes da electrónica e uns
vanguardistas habituais na The Wire), e uma crítica a Dummy dos Portishead
(tenho-a algures; hei-de mostrá-la). Em 94 era um evangelizado do Melody Maker. O Blitz, lera-o ao milímetro até 90.
No início de 95
o António Pires telefona. Receberam a minha carta no Blitz, gostaram do que
leram, sim, estavam à procura de alguém para o Porto, mas não percebiam porque
me candidatava para o Porto a partir de Faro. Combinou-se reunião.
Ainda em
Janeiro, ou talvez já em Fevereiro, desembarquei na estação do Barreiro,
apanhei o cacilheiro e depois o autocarro para Cabo Ruivo, um desterro
industrial cinza a anos da Expo. O edifício da Medipress tresandava a tabaco e
à tinta das rotativas mal se chegava à recepção. Desde então, sempre que cheira
a tinta e a tabaco sigo para a segunda metade da década de 1990, para a Avenida
Infante D. Henrique.
À entrada da
redacção pedi ao tipo alto que me recebeu (o Paulo Sardinha) para falar com o
Sr. António Pires. Além do António, estavam lá o Pedro Gonçalves, a Cláudia Galhós
e o Miguel Francisco Cadete. O Rui Monteiro não estava nessa tarde. A Rita Carmo
e a Cândida Teresa não tenho a certeza.
Falei com o
António Pires e decidiu-se que vinha para o Porto ver como corriam as coisas.
No Porto, à Rua Júlio Dinis, ao pé da Petúlia, o Blitz partilhava instalações
com outros jornais do grupo. Fui partilhar sala com o Adalberto Ramos do
AutoSport. Na outra ala do apartamento convertido em escritórios estavam as salas
d’A Capital, com o Rui Tentugal, o João Faria, o Jorge Sousa e o responsável da
delegação, cujo nome não guardei. Uma última sala era para a dama que cuidava
de publicidade para o Expresso (a redacção do Expresso tinha um piso só para si
num prédio vizinho).
Na secretária
que me era destinada havia uma máquina de escrever. Ao fundo do corredor, um
fax. A alcatifa cinzenta e o tecto amarelecido já não absorviam mais fumo de
tabaco. Da janela via-se Gaia e pores-do-sol gloriosos.
Comecei a
trabalhar na mesma semana em que defendi a tese de licenciatura. A tese era
fraca. A escola, Escola Superior de Jornalismo, era pior.
A primeira
notícia a fazer metia o Carlos Vieira, da Xinfrim. Liguei-lhe do telefone dos
meus avós (era com eles que vivia) e apresentei-me. Primeiro, o Carlos contactou
Lisboa para confirmar se o Jorge Manuel Lopes trabalhava de facto no Blitz.
Comecei a ganhar
dinheiro fazendo exactamente o que gostava logo à primeira. Há 20 anos. No
geral, não me posso queixar.
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